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sábado, 10 de dezembro de 2011

Balada acadêmica aos 20 anos - Aclasb teceu em arte sua própria história: canto, coral, tributo e poesia


Sem competir, mas sem deixar a desejar heavy metal e gêneros excitantes, a Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim (Aclasb) fez dupla celebração na noite desta quarta-feira. Num auditório repleto de acadêmicos e convidados, os 20 anos de sua fundação da instituição a Semana da Cultura foram comemorados lado a lado. Não faltaram emoções e agitos, entusiasmos e encantos. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Juventude e maturidade se viram em vibrações, diferentes, mas nem tão distante do frêmito do hip hop!

Atividades literárias e musicais necessariamente artísticas mantiveram as cortinas abertas para o tempo pré-natalino. Bonfinenses ilustres no passado recente e patronos de fato das cadeiras da instituição ganharam homenagens póstumas da Aclasb e seus familiares - filhos, consortes, parentes – receberam diplomas remissivos ao prestigio dos homenageados. Entre os representantes dos laureados estavam o desembargador Jéferson Muricy, Pedro Castor Xisto e muitos outros.    

Presenças altivas, distintas, togadas ou não, foram à cena do palco e realçaram o melhor da MPB. Existe modéstia mais suntuosa que a reunida na voz e violão de Rogério Moreira? E a brandura insurgente em canto dominante no som delicado de Regina Salgado? Ipi, Ipi urra. Quem foi ao salão da Câmara viu como Paulo Ernesto entra em contrição às canções entoadas (Osvaldo Montenegro?), duas, nacionalíssimas, tal árias da mais pura erudição musical.

Que papelão – Um cego, coitado, respeitoso e moderado, errou o caminho e entrou no local das comemorações. Embora conduzido pelo guia, gastou 69 segundos contados para atravessar cinco metros de salão. Confirmada a gravidade de sua deficiência visual (com ou sem óculos escuros), sobreveio-lhe a pergunta de por que ainda assim seria ele pai de tantos filhos (oito). E o pobre homem, sério e ingênuo, não perdeu o pudor: “Óia, tão pensando qui faço fio é cum os zóio...”. As reações da platéia, sim, foram de risos descomedidos e... (quase) indecorosos – até despertar que estava diante de uma dualidade una: Eugênio Talma/Geninho. Baita show de humor.

Sem sair do chão – Viu-se ademais a matemática verbal com que o fundador da Aclasb compôs e decompôs os 20 anos de Aclasb. Cada época tem uma auréola poética, o nome de uma rua; cada sujeito lembrado está numa estrofe e nalgum inolvidável viés cultural; cada fato vem narrado em mescla de qualidades artísticas peculiares. É o intelecto de Paulo Machado. Quando pára a sonoridade da declamação histórica, sucedem-lhe a cadência dos aplausos. Da mesa, o acadêmico Aurélio Soares ensaiou a indefectível coreografia. O fotógrafo Cinco Mil flagrou. Esse rolé excêntrico dominou a todos no auge da orquestra da Saudade e o maestro Fernando Dantas sorriu feito criança – mas não pediu pra galera nenhuma sair do chão.

O mundo é aqui – As poesias natalinas, saudosas menções aos que fazem arte e letra em Senhor do Bonfim e as evocações a Jesus Cristo foram cercadas no início pelo Hino Nacional, no fim pelo Hino a Senhor do Bonfim. Porém houve na abertura três páginas de José Gonçalves que o dignificam como presidente da Aclasb. Nelas ele disse da origem, do desenvolvimento e do futuro do movimento acadêmico ao redor do mundo. Abreviou brilhantemente de como homens e mulheres que agem e pensam artisticamente trouxeram essa forma de expressar sabedoria aos nossos dias. Um resumo histórico literário próprio de quem comete academia (texto integral no final da matéria). Vale conferir.

Homenageados – Diplomas de Honra ao Mérito (in memoriam) foram concedidos aos acadêmicos falecidos: Joaquim Muricy Sobrinho, Zenáurea Teresinha Campos Dias, Antônio Martins de Souza, Maurício Salamá, Caio Mário Félix Martins, Antônio de Carvalho Melo, José Santos “Zequinha Poeira”, Antônio Augusto Castor Xisto, Osvaldo Alves Aragão, Raimundo Izidório dos Santos e Antônio José Gonçalves da Silva. Os diplomas foram entregues em cerimônia formal e a recepção foi honrosa.
Cada recital esteve sob as coordenadas cerimoniais de Tito Rocha e Eleonor Sena Gomes. Téo Canarana teclou acordes para ouvidos apurados: Carlos de Tijuaçu, secretária de Cultura Riana Oliveira (ambos na Mesa), acadêmico Josemar Santana etc.

Em breve vôo alçado, o dizer do presidente:
Senhores e senhoras,
Surgida no século IV a.C., do gênio inventivo de Platão, a primeira academia teve lugar nos arredores de Atenas, nos chamados jardins de Academus, herói grego da guerra de Tróia, vivido no século XII a.C. Embora destinada ao culto oficial das musas, ali se desenvolvia extensa atividade intelectual, reunindo-se diversos domínios do saber, como a Filosofia, a Matemática, a Música, a Astronomia e a Legislação.

A obra iniciada pelo filósofo ateniense e continuada por seus discípulos, constitui-se em importante marco do saber ocidental, sendo a fonte originária de todas as academias que, a partir de então, passaram a estabelecer-se no mundo inteiro, marcando épocas e lugares.

A título de ilustração, importa destacar algumas dessas academias: Academia Platônica, fundada em Florença por volta de 1440 – Era a mais famosa da Renascença Italiana; Academia Francesa, criada em 1635, por iniciativa do Cardeal Richelieu, no reinado de Luis XIII; Academia Espanhola, instituída em 1713, por obra de Juan Manuel Fernandez Pacheco, no reinado de Felipe V; Academia Real das Ciências de Lisboa, fundada em 1779, no reinado de D. Maria I, em pleno Iluminismo; Academia Brasileira de Letras, estabelecida em 1896, por Araripe Júnior, Raul Pompéia e Machado de Assis, que foi o seu primeiro presidente.

A fundação da Academia Brasileira de Letras fez desencadear o surgimento das – por assim dizer – academias estaduais, em praticamente todos os estados brasileiros. Entre elas a da Bahia, de 1917. Desse movimento, resultam as demais academias que se seguiram depois e que ainda hoje não cessam de se multiplicar. Conta-se no Brasil, atualmente, com uma constelação de muitas centenas dessas confrarias, cobrindo distintas áreas do pensamento, como a Literatura, as Artes (de um modo geral), o Direito, a Medicina, a Filosofia, a Religião, etc.

Como a academia de Platão, as academias de letras, ao longo da sua história, têm se caracterizado pela capacidade de dialogar, no mesmo espaço e em torno do mesmo objetivo, com os mais diversos campos do conhecimento. É o que Haroldo de Campos chamou de “movimento dialógico da diferença”. No caso em apreço, esta tem sido a condição primordial para a consolidação da unidade dos saberes e, por conseguinte, para a conservação do edifício cultural, na acepção plena da palavra.

Para Noberto Bobbio, enquanto a política divide – e divide porque vive do conflito – a cultura une – e une porque vive do diálogo. A assertiva do ilustrado pensador italiano traz à memória a palavra balizada de Machado de Assis, que ao tomar posse como presidente da Academia Brasileira de Letras, em 1897, cunhou o escopo daquela entidade: “conservar, no meio da federação política, a unidade literária”.

A ACLASB não foge à regra. Consoante os estatutos que a regem, sua missão capital é unir homens e mulheres de letras e artes, com vistas à promoção e aprimoramento da cultura bonfinense, nas suas diferentes manifestações. Este foi o sonho que moveu os corações dos seus idealizadores, quando da sua fundação, naquele cinco de dezembro de 1991. E para isto nunca faltou empenho, embora nem sempre se tenha obtido o resultado esperado, haja vista as dificuldades que, não raro, costumam rodear esse tipo de atividade. 

Ao completar 20 anos de instalação, a Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim sela, mais uma vez, seu compromisso com a cultura local, na certeza de que, doravante, além de contar com maior dedicação da parte dos seus honrosos membros, também gozará do apoio afetuoso da comunidade bonfinense.

Ainda no ensejo do seu 20° aniversário, a ACLASB sente-se no dever de reverenciar a memória daqueles que um dia tomaram parte no seu quadro de sócios, sejam eles fundadores ou não, e que hoje já não habitam mais aqui, pelo menos fisicamente.
Guimarães Rosa, em discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, poucos dias antes de morrer, asseverou que “as pessoas não morrem, ficam encantadas”. Lá onde estiverem, nossos venerandos e eternos confrades, seguramente, estão a velar por nós e a alimentar nossos sonhos de uma academia melhor, mais atuante e mais profícua.

Parafraseando Shelley, quando da morte prematura de Keats, diríamos que “eles alçaram seu vôo além das trevas das nossas noites”. Por isso, jamais morrerão!"


Assessoria de Comunicação Social - Prefeitura de Senhor do Bonfim

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim comemorou seus 20 anos de fundação

A Academia de Letras e Artes em sessão magna na noite desta quarta-feira 07 no salão da câmara de vereadores de senhor do Bonfim comemorou seus 20 anos de fundação e homenageou personalidades bonfinenses, que contribuíram para elevação da cultura no município.
Na cerimônia de abertura para  compor a mesa estiveram presentes: Jeferson Muricy( desembargador ) que teve seu pai homenageado, Paulo Machado( fundador da academia e prefeito de Senhor do Bonfim), Dr. Aurélio Soares( vice-prefeito), Carlos de Tijuaçú( vereador), José Gonçalves( presidente da Academia de Letras) e Riana Oliveira( Secretária de Cultura).    
Na noite de homenagem, o jovem Pedro Castor , juntamente com sua família recebeu das mãos de Tito Rocha a homenagem feita pela Academia de Letras e Artes a seu pai Antônio Augusto Castor Xisto, que além de escritor, cronista, poeta e músico, foi membro fundador junto com outros colegas da Casa dos Artistas Bonfinenses, foi locutor da Rádio Caraíba e fundador, e membro fundador da Academia de Letras, entre  outras conquistas relevantes para a cultura, o filho do homenageado, Pedro Castor falou: “estou muito feliz de estar recebendo esta homenagem feita ao meu grande pai que é meu ícone, poderia passar a noite inteira falando das conquistas deixadas para a cultura bonfinense e dos seus bons exemplos , quero aproveitar a oportunidade para fazer um pedido ao prefeito Paulo Machado: a construção de um museu em Senhor do Bonfim, realize prefeito este sonho, que não e só de meu pai e sim de todos nós bonfinenses, não só o de relíquias, mas também o de fotografia das personalidades da cidade, pois cidade que não tem passado, não tem futuro. Aproveito e finalizo contando aqui uma historia de Ruy Barbosa que intitulou Bonfim como Terra do Bom Começo. Conta o imaginário popular que Ruy Barbosa criava patos e chegando em sua residência encontrou um ladrão em seu quintal com dois patos em mão, então interpelou o homem dizendo: Ô rapaz, não é pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes e sim pelo ato vil e sorrateiro de galgares os profanos de minha residência. Se o fazes por necessidades,transijo; mas sé é para zombares de minha alta prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala no alto de tua sinagoga. Ele sem entender nada disse olhando para Ruy Barbosa disse: o senhor quer que  eu leve o pato ou deixe o pato?”               
A cerimônia de homenagem da Academia de Letras e Artes foi marcada em comemoração ao “Dia da Cultura Bonfinense” ,que ficou no calendário da cidade pela vinda do memorável Ruy Barbosa em nosso município no dia 5 de dezembro no ano de 1919.  As apresentações da noite tiveram as participações dos artistas: Rogério Moreira e seus filhos, de Regina Salgado , Téo Canarana, Geninho(  ator teatral ) e  da orquestra da Saudade do maestro Fernando Dantas.
Por Adriana Longuinho

DISCURSO PROFERIDO DURANTE SESSÃO SOLENE EM HOMENAGEM À SEMANA DA CULUTRA BONFINENSE E 20° ANIVERSÁRIO DA ACADEMIA DE LETRAS E ARTES DE SENHOR DO BONFIM

Senhores e senhoras,

Surgida no século IV a.C., do gênio inventivo de Platão, a primeira academia teve lugar nos arredores de Atenas, nos chamados jardins de Academus, herói grego da guerra de Tróia, vivido no século XII a.C. Embora destinada ao culto oficial das musas, ali se desenvolvia extensa atividade intelectual, reunindo-se diversos domínios do saber, como a Filosofia, a Matemática, a Música, a Astronomia e a Legislação.

A obra iniciada pelo filósofo ateniense e continuada por seus discípulos, constitui-se em importante marco do saber ocidental, sendo a fonte originária de todas as academias que, a partir de então, passaram a estabelecer-se no mundo inteiro, marcando épocas e lugares.

A título de ilustração, importa destacar algumas dessas academias: Academia Platônica, fundada em Florença por volta de 1440 – Era a mais famosa da Renascença Italiana; Academia Francesa, criada em 1635, por iniciativa do Cardeal Richelieu, no reinado de Luis XIII; Academia Espanhola, instituída em 1713, por obra de Juan Manuel Fernandez Pacheco, no reinado de Felipe V; Academia Real das Ciências de Lisboa, fundada em 1779, no reinado de D. Maria I, em pleno Iluminismo; Academia Brasileira de Letras, estabelecida em 1896, por Araripe Júnior, Raul Pompéia e Machado de Assis, que foi o seu primeiro presidente.

A fundação da Academia Brasileira de Letras fez desencadear o surgimento das – por assim dizer – academias estaduais, em praticamente todos os estados brasileiros. Entre elas a da Bahia, de 1917. Desse movimento, resultam as demais academias que se seguiram depois e que ainda hoje não cessam de se multiplicar. Conta-se no Brasil, atualmente, com uma constelação de muitas centenas dessas confrarias, cobrindo distintas áreas do pensamento, como a Literatura, as Artes (de um modo geral), o Direito, a Medicina, a Filosofia, a Religião, etc.

Como a academia de Platão, as academias de letras, ao longo da sua história, têm se caracterizado pela capacidade de dialogar, no mesmo espaço e em torno do mesmo objetivo, com os mais diversos campos do conhecimento. É o que Haroldo de Campos chamou de “movimento dialógico da diferença”. No caso em apreço, esta tem sido a condição primordial para a consolidação da unidade dos saberes e, por conseguinte, para a conservação do edifício cultural, na acepção plena da palavra.

Para Noberto Bobbio, enquanto a política divide – e divide porque vive do conflito – a cultura une – e une porque vive do diálogo. A assertiva do ilustrado pensador italiano traz à memória a palavra balizada de Machado de Assis, que ao tomar posse como presidente da Academia Brasileira de Letras, em 1897, cunhou o escopo daquela entidade: “conservar, no meio da federação política, a unidade literária”.

A ACLASB não foge à regra. Consoante os estatutos que a regem, sua missão capital é unir homens e mulheres de letras e artes, com vistas à promoção e aprimoramento da cultura bonfinense, nas suas diferentes manifestações. Este foi o sonho que moveu os corações dos seus idealizadores, quando da sua fundação, naquele cinco de dezembro de 1991. E para isto nunca faltou empenho, embora nem sempre se tenha obtido o resultado esperado, haja vista as dificuldades que, não raro, costumam rodear esse tipo de atividade.  

Ao completar 20 anos de instalação, a Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim sela, mais uma vez, seu compromisso com a cultura local, na certeza de que, doravante, além de contar com maior dedicação da parte dos seus honrosos membros, também gozará do apoio afetuoso da comunidade bonfinense.

Ainda no ensejo do seu 20° aniversário, a ACLASB sente-se no dever de reverenciar a memória daqueles que um dia tomaram parte no seu quadro de sócios, sejam eles fundadores ou não, e que hoje já não habitam mais aqui, pelo menos fisicamente.

Guimarães Rosa, em discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, poucos dias antes de morrer, asseverou que “as pessoas não morrem, ficam encantadas”. Lá onde estiverem, nossos venerandos e eternos confrades, seguramente, estão a velar por nós e a alimentar nossos sonhos de uma academia melhor, mais atuante e mais profícua.

Parafraseando Shelley, quando da morte prematura de Keats, diríamos que “eles alçaram seu voo além das trevas das nossas noites”. Por isso, jamais morrerão!


Senhor do Bonfim, 07 de dezembro de 2011

José Gonçalves do Nascimento  - Presidente da Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O ENCANTO DO CORDEL

José Gonçalves do Nascimento 
Presidente da Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim 

Há meses no ar, a novela global Cordel Encantado continua encantando o telespectador brasileiro. Não é a primeira vez que o tema ocupa a telinha (ou a telona) da família Marinho. Recordem-se, a propósito, clássicos da teledramaturgia como O Bem Amado, Roque Santeiro, O Auto da Compadecida, Hoje é Dia de Maria, etc. Todavia, Cordel Encantado é a peça que mais se aproxima do mundo fantástico da Literatura de Cordel.
É evidente que alguns elementos precisam ser questionados. No que diz respeito ao cangaço, por exemplo, causa-nos estranheza ver cangaceiros usando brinquinhos, morando em tendas ricamente mobiliadas, dirigindo carro de luxo, frequentando cafés, e circulando quase que livremente sob o olhar da polícia e das autoridades. No tocante ao misticismo religioso, outro elemento presente na trama, o profeta Miguezinho (Matheus Nachtergaele) é apresentado de forma caricata, mesclando momentos de lucidez com surtos de loucura, o que, de certa  forma, acaba contribuindo para a deturpação de uma das figuras mais ricas da religiosidade popular do Nordeste: o beato.
A peça de Thelma Guedes e Duca Rachid, entretanto, ostenta o mérito de trazer para a ordem do dia o tema da Literatura de Cordel com todo o seu universo fabuloso, que vai desde a xilogravura, presente na abertura do folhetim, até o enredo propriamente dito. Trata-se, sem dúvida, de uma grande contribuição para o processo de resgate e preservação da Literatura de Cordel, enquanto manifestação da cultura popular.
Em quase dois séculos de presença em terras nordestinas, a Literatura de Cordel jamais perdeu sua identidade. O segredo disso está na sua força comunicativa. Além da sua beleza poética, o Cordel se caracteriza também pela simplicidade da linguagem e pela objetividade com que trata os temas mais complexos.
Na época em que não havia o rádio nem a televisão e os jornais eram privilégio de poucos, foram os poetas populares os principais responsáveis pela veiculação de informações. Os fatos mais importantes eram levados ao grande público através dos Folhetos de Cordel. Além de jornalistas e repórteres, os cordelistas foram também cronistas, historiadores, humoristas, romancistas, etc.
Os tempos mudaram, mas a Literatura de Cordel continua fascinante. Para muitas pessoas ela é a única opção de leitura. Felizmente, a cada dia despontam novos cordelistas dispostos a darem continuidade a essa tradição cultural.
Viva o Cordel, agora e sempre!

DISCURSO DE POSSE NO LIONS CLUBE VILA NOVA DE SENHOR DO BONFIM



Senhores e senhoras,


É com redobrada satisfação que compareço a esta solenidade, convidado que fui a tomar posse como o mais novo membro do honroso Lions Clube Vila Nova de Senhor do Bonfim. Não menor do que a satisfação é o senso de responsabilidade que agora nutro, em face da missão que me é outorgada neste momento, para mim todo especial.

E ao receber semelhante honraria, não posso esquivar-me de fazer reverência aos homens e mulheres que, ao longo de mais de noventa anos e, quais emissários do bem, levaram e continuam levando vida, esperança e alegria a milhões de pessoas, esparsas nos quatro cantos do planeta.

Não seria justo calar-me diante da memória de Melvin Jones, o empresário sonhador de Chicago que, no longínquo 1917, resolve romper o círculo fechado e individualista do mundo dos negócios, para lançar-se de forma despretensiosa no serviço aos seus semelhantes.

Não seria perdoável se, por descuido, eu ignorasse a luta quase diuturna dos incansáveis integrantes deste Clube bonfinense, que tão relevantes serviços têm prestado ao povo desta terra, a exemplo das recentes campanhas pela redução do preço do botijão de gás e de aferição da pressão arterial em favor dos mais pobres e carentes.

Imperdoável seria ainda, olvidar a gigantesca rede de parceiros e colaboradores, homens e mulheres de boa vontade, que ao longo dos anos, e por toda parte, têm contribuído para o bom êxito das campanhas a que são convocados, não se furtando jamais de qualquer participação neste particular.

Noventa anos de sucesso não seria possível se o móvel da Associação Internacional de Lions Clubes não fosse a dedicação à causa humana, desdobrada em ações que outro fim não têm, senão contribuir com a melhora da qualidade de vida de um sem-número de homens e mulheres, difusos pelos mais longínquos rincões da terra.     

Com efeito, quando em 1917 Melvin Jones resolveu ultrapassar as fronteiras do seu círculo de negócios, superando uma lógica estritamente comercial, almejava este benemérito homem de negócios levar a cabo uma cultura solidária que pudesse melhorar a vida da sua comunidade e dos seus semelhantes.

Nessa época, a América vinha assistindo, de norte a sul, ao surgimento de organizações associativas dos mais diferentes matizes. Nova York, São Francisco, Washington, Chicago e todos os grandes centros urbanos possuíam suas associações, cujo lema comum era: “ajudar uns aos outros”.

Melvin Jones foi mais além. O momento fundante foi a pergunta por ele formulada: “Que tal se os homens que têm sucesso devido à sua energia, inteligência e ambição, usassem seus talentos para melhorar suas comunidades?”. A partir daí, Jones começa a empreender esforços no sentido de estabelecer uma associação que pudesse agregar o maior número possível de clubes de serviço. A 7 de julho de 1917, durante reunião tida num hotel de Chicago, com a presença de dezenas de delegados dos mais diversos clubes dos Estados Unidos, e sob a presidência de Melvin Jones,  deliberou-se pela formação da Associação de Lions Clube, que passaria a operar meses depois, quando da Convenção de Dallas, realizada de 8 a 10 de outubro daquele mesmo ano.

Um dos objetivos apontados naquele momento, rezava que a Associação não deveria ter como meta os interesses comerciais dos seus integrantes. 

Posteriormente, Jones abandonou sua agência de seguros para dedicar-se exclusivamente ao Lions na sede internacional da Associação, na cidade de  Chicago, estado de Illinois. Graças ao prestígio de Melvin Jones, o Lions Clube logo atraiu a atenção de homens e mulheres do mundo inteiro.  Líderes comunitários começaram a fundar clubes em toda a América e a Associação tornou-se internacional com a fundação de clubes no Canadá, China, México, Cuba, entre outros. Em apenas 10 anos de existência, o Lions já possuía 60 mil membros, distribuídos em 1.183 clubes.

Em 1945 Melvin Jones foi convidado, como consultor, a representar o Lions Clube na Conferência Internacional, realizada em São Francisco, Califórnia, na qual teve origem a Organização das Nações Unidas (ONU), o órgão mundial responsável pela garantia da paz, do desenvolvimento e do direito dos povos.  

O exemplo de Jones, cujo lema era: “você não pode ir muito longe, enquanto não começar a fazer algo pelo próximo”, não apenas enobrece a família leonística, como também eleva o gênero humano, na sua vocação natural para o amor, a solidariedade, o bem comum.

A árvore boa cresceu e frutificou.  A associação é, hoje, a maior organização não governamental do mundo, com mais de 1,4 milhões de membros, distribuídos em aproximadamente 43 mil clubes, e cobrindo mais de 200 países.

O foco maior das atividades do Lions Internacional é a conservação da visão, embora outras ações venham sendo perseguidas, a exemplo dos programas de prevenção contra as drogas e as diabetes, para citar apenas alguns.

Há uma campanha em curso, intitulada: Campanha da Visão em Primeiro Lugar, a Sight First, cujo objetivo é levantar fundos para investir na cura e prevenção de 40 milhões de casos de cegueira hoje existentes e preveníveis. Com o recurso arrecadado, hospitais de olhos já estão sendo construídos em lugares de maior necessidade. Só na Índia mais de 300 mil cirurgias de cataratas já foram efetuadas.

Companheiros, é com essa mesma abertura para o serviço aos mais necessitados, que tem militado o Lions Clube Vila Nova de Senhor do Bonfim. E, a exemplo de outras experiências exitosas, espalhadas pelo Brasil e pelo mundo, temos a mais absoluta convicção de que o empenho da família leonística bonfinense ainda haverá de produzir muitos frutos.

Doravante, este passará a ser também um compromisso meu. E, com fé em Deus, espero não decepcionar a confiança daqueles que em mim acreditaram, conferindo-me tão importante distinção.

Encerro estas poucas e humildes palavras, reportando-me a madre Tereza de Calcutá, um dos maiores exemplos de solidariedade dos tempos atuais: “Por vezes sentimos que aquilo que fizemos não é senão uma gota de água no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota de água”.

Muito Obrigado,


José Gonçalves do Nascimento
Senhor do Bonfim, 27 de outubro de 2011

terça-feira, 29 de novembro de 2011

DR. JOSÉ GONÇALVES DA SILVA: O HOMEM, SEU TEMPO, SUA CIRCUNSTÂNCIA





Por: José Gonçalves do Nascimento
Presidente da Academia da Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim




Comemora-se este ano o centenário de morte de José Gonçalves da Silva, um dos personagens mais vibrantes da história baiana, tendo sido, entre outras coisas, o primeiro intendente de Senhor do Bonfim e o primeiro governador constitucional da Bahia.    

José Gonçalves nasceu em Mata de São João, em 28 de dezembro de 1838. Em 1859 formou-se em Direito pela Faculdade de São Paulo. Logo em seguida, 1860, mudou-se para a fazenda Piabas, na época território de Villa Nova da Rainha, hoje município de Campo Formoso. Ali exerceu a atividade política, filiado ao Partido Conservador.*

Em 1862 foi nomeado Coronel da Guarda Nacional em Vila Nova da Rainha, confirmando-se, destarte, o prestígio do jovem bacharel de apenas 24 anos, que, logo em seguida, ingressa na carreira política, onde atuou por mais de quatro décadas.

De fato, pouco tempo depois, em 1865, assumiu ele o comando local do Partido Conservador e, no mesmo ano, tendo lugar as eleições municipais, impõe fragorosa derrota às forças adversárias.

Durante a guerra do Paraguai foi ele quem organizou o corpo de voluntários da Pátria que partiu da então futura Terra do Bom Começo para a zona do conflito, sendo, por isso, agraciado com o título de Cavaleiro Imperial da Ordem da Rosa.

Dono de considerável fortuna, suas fazendas compreendiam largas extensões de terra nos municípios de Curaçá, Jaguarari, Campo Formoso e Senhor do Bonfim.

Em 1868 foi eleito deputado provincial pelo quarto distrito, do qual era sede Vila Nova da Rainha e, logo em seguida, teve o nome sufragado para deputado Geral na Corte, pela Província da Bahia. Durante o mandato parlamentar, tomou parte em discussões históricas como as que trataram da abolição da escravatura.

Afastado da política nos últimos anos do Império, foi, entretanto, um dos primeiros chefes políticos a aderir ao regime republicano instalado em 15 de novembro de 1889. Foi ele o “inspirador da adesão de Bonfim à República”, como bem pontua o douto ensaísta bonfinense Adolfo Silva. Sob sua liderança, foi organizada no dia 17 de novembro de 1889, concorrida passeata pelas ruas de Senhor do Bonfim, em apoio à nova forma de Governo. No dia 19 do mesmo mês, sempre sob sua orientação, teve lugar na Câmara de Vereadores a adesão oficial da Vila ao regime imposto por Deodoro da Fonseca. É o que se lê na ata que registrou aquela sessão memorável:

“O senhor presidente disse que tendo-se estabelecido no Rio de Janeiro um Governo provisório – que aboliu a Monarquia neste país ele convocara esta sessão extraordinária para deliberar-se sobre os últimos acontecimentos que mudaram radicalmente a forma de Governo da nação, e que consultava a opinião dos vereadores sobre a atitude a tomar-se nas atuais emergências. Que desde já manifestava sua opinião que é de plena adesão ao Governo Republicano, e que portanto os senhores vereadores que aderissem à mesma ideia se levantassem. Os vereadores levantaram-se todos demonstrando assim aderirem à ideia apresentada pelo senhor presidente o qual levantou-se e deu vivas à República”.

Posição diferente teve a capital baiana que, só depois de muito relutar, resolveu aderir às mudanças ocorridas na capital do país, dando-se posse ao primeiro Governador Republicano da Bahia, o médico Manoel Vitorino Pereira.

Instalado na Bahia o Governo da República, o natural é que dele tomassem parte os antigos líderes dos clubes republicanos: professores, estudantes, profissionais liberais, gente do povo, etc., que, desde os anos setenta daquele século XIX, debatiam-se na defesa do regime que, finalmente, se instaurou no Brasil em novembro de 89.  Mas não foi o que aconteceu. Sem mudanças significativas nos rumos da política estadual, a Bahia continuou nas mãos das mesmas oligarquias, que no passado serviram de sustentáculo à ordem imperial.

A despeito de republicano de última hora, José Gonçalves foi, através de decreto de 2 de fevereiro de 1890, nomeado primeiro intendente municipal de Senhor do Bonfim, cargo que ocupou até 15 de outubro do mesmo ano, quando, por nomeação do Governo Provisório de Deodoro da Fonseca, passa a assumir o Governo do Estado em substituição a Virgílio Clímaco Damásio. Em carta de 22 de outubro daquele ano, escreve ele ao Barão de Jeremoabo: “Já deves saber que, por desconto dos meus pecados, estou nomeado Governador da Bahia. A mim são passados quatro dias depois da comunicação da nomeação, e ainda parece-me que isso não passou de um sonho”.

Sua nomeação, conforme observou o historiador Antônio Ferrão Muniz de Aragão, chegou a causar estranheza, mas não despertou animosidade. “É que o novo governador – pontua Aragão – além de gozar da justa fama de homem de bem, vivia há muito afastado da atividade política, de forma que receios não existiam de que para o governo levasse ódios e paixões”.

Governador, a ele coube a tarefa de convocar a Assembleia Constituinte Republicana do Estado, não lhe faltando críticas pela forma pouco conciliadora, e um tanto autoritária, com que se portou em face de tal processo, desde as eleições parlamentares, até a instalação da Presidência da Mesa, quando, usando do prestígio do cargo, fez vencer o candidato da sua predileção, o senador Luiz Viana.

De todo modo, no dia 2 de julho de 1891, no mesmo dia da promulgação da Primeira Constituição Republicana da Bahia e com apoio dos líderes mais importantes do Partido Conservador, como Luiz Viana, rico proprietário de terras do município de Casa Nova e Cícero Dantas Martins, o Barão de Jeremoabo, chefe político e latifundiário, com larga influência em diversos municípios do sertão baiano e até em Sergipe, era o líder vilanovense eleito pelo voto da maioria dos constituintes, primeiro Governador Constitucional do Estado da Bahia.

Permanecendo à frente da administração pouco mais de um ano, Gonçalves limitou-se à manutenção da ordem, não contando seu governo com grandes iniciativas, além dos expedientes corriqueiros. É o que se depreende da leitura dos relatórios referentes àquele período, hoje constantes dos arquivos do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia. Sua gestão, todavia, ostenta o mérito de haver contribuído para a consolidação do regime republicano, em nível estadual, num dos momentos mais conturbados da história política da Bahia.  

As coisas iam de vento em popa a favor do governador até que um fato de alcance nacional mudou o curso das águas.

Quando em 3 novembro de 1891 o Marechal Deodoro da Fonseca, querendo afirmar sua autonomia sobre o Poder Legislativo, determina a dissolução do Congresso Nacional, José Gonçalves lhe emprestou apoio. A posição do Governador não agradou aos aliados, que esperavam uma atitude mais cautelosa por parte do Chefe do Executivo Baiano.

Mergulhado na primeira crise institucional do Governo Republicano e sem o apoio da nação, Deodoro acaba renunciando ao posto para dar lugar ao vice Floriano Peixoto que, imediatamente, retoma a ordem legal e restabelece o Poder Legislativo. Alçado ao poder, Floriano começa a caça às bruxas, fazendo derrocar, um a um, os governadores fiéis a Deodoro.

José Gonçalves era um desses.

No dia 24 de novembro de 91, ante a renúncia do marechal Deodoro e a ascensão ao poder de Floriano Peixoto, numerosa multidão, capitaneada pelo líder oposicionista, deputado Cézar Zama, reuniu-se em frente ao palácio do Governo para exigir o afastamento de José Gonçalves. Nesse mesmo ato público, e sempre sob o comando de Cézar Zama, constituiu-se comissão para ir ter com o Governador e obrigá-lo a deixar o cargo.

Versado nas letras gregas e latinas, cultor da história e contando com longos anos de vida pública, Zama conhecia a psicologia das massas e sabia tirar partido das situações mais insignificantes.

Aos emissários do parlamentar nascido em Caitité, José Gonçalves respondeu não “aquiescer àquela intimação, que não exprimia senão a vontade de uma fração muito limitada do povo da Capital, sem intervenção dos habitantes do centro”.

Diante disso, o líder da oposição dirigiu-se ao povo dizendo: “o momento é gravíssimo; ou viver ou morrer (...). Já que o Governador disse não entregar-se, nosso dever é ir até a residência de S. Exa. e intimá-lo a depor o governo nas mãos do povo”.

Após forte resistência, que redundou, inclusive, em dezenas de mortos e feridos, José Gonçalves acaba deposto do cargo, sendo sucedido pelo General Tude Soares Neiva, comandante do 13º Distrito Militar. Este, poucos dias depois, seria substituído pelo almirante Joaquim Leal Ferreira, então presidente do Senado Estadual**, ocupante da vaga deixada por Luiz Viana, o qual renunciou o comando da Casa para não assumir o posto deixado por Gonçalves, alegando não compreender “Governo sem força”.

Ocorre que pela Constituição Promulgada naqueles dias, era o presidente do Senado Estadual o substituto imediato do Chefe do Executivo. Político hábil e experiente, Viana aguardava eleger-se governador em circunstância mais estável, o que, de fato, ocorrerá cinco anos mais tarde.

No sertão, o fato inflamou os ânimos dos correligionários de José Gonçalves que, valendo-se das câmaras municipais e dos jornais de que eram proprietários, fizeram ecoar seu grito de protesto em apoio ao amigo e líder. Em pelo menos três municípios, Bonfim, Campo Formoso e Queimadas, tiveram lugar tais manifestações.

Em 1892, à frente os remanescentes do antigo Partido Conservador, é fundado na Bahia o Partido Republicano Federalista, sendo Gonçalves escolhido presidente da nova agremiação. Naquele mesmo ano, havendo lugar as eleições parlamentares, foi o ex-governador eleito Senador Estadual, cargo que renunciaria mais tarde, quando da cisão do partido que chefiava.

Em junho de 1893 ocorre o que há muito já se esperava. As divergências entre José Gonçalves e Luis Viana, em torno da limitação ou não da autonomia municipal, provocaram um racha no Partido Republicano Federalista, o que resultou na configuração de dois grupos rivais: o Vianista e o Gonçalvista. Essa cisão levaria ao surgimento de dois partidos políticos: o Partido Republicano Federal da Bahia, liderado por Viana e o Partido Republicano Constitucional, regido por Gonçalves e seu aliado, o também senador estadual Barão de Jeremoabo.

Naquele mesmo ano, foi o político bonfinense convidado por Floriano Peixoto para assumir o Ministério do Exterior, mas declinou do convite.

Derrotado em 94 no pleito para o Senado Federal, Gonçalves foi reeleito no mesmo ano senador estadual, num processo de escolha de todo inusitado. Postas as eleições, era a primeira vez que os dois grupos rivais iriam medir  suas forças num pleito de nível estadual e nenhum deles poderia fraquejar. Do contrário seria alijado do poder. No momento da apuração, apesar dos esforços de fiscalização empreendidos por ambas as partes, nenhuma das facções ligou para o resultado das urnas, “empanturrando de votos os seus candidatos e dando-os como eleitos,” como recorda o já mencionado historiador Antônio Ferrão Moniz de Aragão.

Tal procedimento levou a uma duplicata de atas eleitorais, lavradas a bico de pena, que geraram a duplicata de diplomas e, por conseguinte, a duplicata do Poder Legislativo – Assembleia e Senado. De forma que a Bahia passou a ter dois Legislativos atuando paralelamente. Um, liderado pelos governistas, tendo à frente Luis Viana; o outro, pela oposição capitaneada por José Gonçalves e seu fiel escudeiro, Cícero Dantas Martins.

Essa mesma situação repetir-se-ia em 1895, desta feita em relação ao Executivo. O Governador Rodrigues Lima se afastou do Governo por motivos de saúde, cabendo ao presidente do Senado Estadual suprir a vacância do cargo. Como havia dois senados e, consequentemente, dois presidentes reivindicando o mesmo posto, acabou por proceder-se também à dualidade do Poder Executivo. Assim, de 18 de outubro a 20 de dezembro de 95, a Bahia operou com dois chefes do Executivo (o Barão de Jeremoabo e o Barão de Camaçari). O impasse só se resolveu quando Lima retornou ao Governo.

Àquela altura, a carreira política de Gonçalves já havia chegado ao declínio. Alijado do poder e sem o prestígio político de outrora, o ex-líder conservador, sempre ao lado do amigo fiel, o barão de Jeremoabo, ainda tentou, mas não conseguiu se reerguer. Recolhido em 1907 no feudo das Piabas, faleceu em 15 de agosto de 1911. Ali mesmo foi enterrado, servindo-se de húmus para a terra que lhe conferiu prestígio, fortuna e poder.

Odiado por uns, mas admirado por outros, dele disse o Barão de Cotegipe: “no meio de tantas fraquezas e misérias, consola ver-se que ainda há homens de caráter”.

Também Ruy Barbosa deixaria consignada sua apreciação a respeito do líder vilanovense: “verdadeira capacidade de estadista, cuja cultura não comum tão mal julgada pelos que vêem de longe o espesso esmalte de sua modéstia, não consegue encobrir aos que o tratam”.

Passada, contudo, a fase gloriosa de sua trajetória pública, o velho caudilho desabafa em carta dirigida ao amigo Jeremoabo: “Política é isso mesmo. Ninguém se lembra do companheiro, que estropiado, ou exausto de forças, ficou na estrada e eu me considero neste número”.

Isto render-lhe-ia um bom epitáfio...




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Notas

* Fundado em 1836, durante a regência de Feijó, o Partido Conservador reunia grandes proprietários de terra, ricos comerciantes e altos funcionários do Governo. Tendo por plataforma política a defesa do poder central, a conservação do trabalho escravo e a manutenção da economia agrário-exportadora, tal agremiação alternou com seu opositor, o Partido Liberal, o comando da presidência do conselho de ministros do Império, desde o período regencial até o ocaso da Monarquia em 1889.


** Em consonância com a Constituição Federal Republicana de 1891, que conferia a cada Estado a liberdade de organizar seu poder legislativo, a Bahia optou pelo bicameralísmo, reproduzindo o modelo da União, com Câmara e Senado.  Assim, contando com vinte e uma cadeiras, o Senado Estadual da Bahia operou de 1891 até 1930, quando foi extinto pelo Estado Novo de Getúlio Vargas.


“SALVE”, CAPOEIRA

Por: José Gonçalves do Nascimento
Presidente da Academia de Letras e Artes de Senhor do Bonfim



No princípio

As origens da capoeira no Brasil remontam à entrada dos primeiros africanos em terras brasileiras. Ao chegar no Brasil, os africanos perceberam a ncessidade de desenvolver técnicas de proteção contra as atrocidades  a eles infligidas pelos senhores de escravo.

Os negros, todavia, não tinham autorização para praticar qualquer tipo de luta. Por essa razão, eles passaram a utilizar-se de ritmos e danças trazidos da África, transformando-os em instrumento de resistência. Surgia, assim, a Capoeira, espécie de arte marcial disfarçada de dança.

Desenvolvida próximo às senzalas e terreiros, a prática da Capoeira objetivava também  à conservação da cultura, ao alívio do estresse e à manutenção da saúde. Às vezes, as lutas ocorriam em campos abertos, nas  chamadas capoeiras, tendo-se aí a origem do nome da performance.

Até a década de 30, a prática da Capoeira era proibida no Brasil, por ser considerada algo subversivo. A própria polícia tinha ordens para prender os capoeiristas que porventura fossem encontrados praticando a luta.

Em 1930, mestre Bimba, um dos mais respeitavéis capoeiristas de todos tempos,  apresentou a arte  para  o presidente Getúlio Vargas. Este, ficou tão encantado com o que viu, que acabou declarando a Capoeira como esporte nacional.

Em 2008, depois de mais de 300 anos de história, a Capoeira foi reconhecida como Patrimônio da Cultura Brasileira.


Mestre Alexandrão

Em Senhor do Bonfim, a história da Capoeira começou  nos anos 60 com a chegada de mestre  Alexandrão. Alexandrão, também conhecido como Negro Angoleiro, era natural de Santo Amaro e, chegando em Senhor do Bonfim, pôs-se a ministrar aulas de Capoeira, atuando, inicialmente, em sua própria residência, situada à Rua do Bandeira. Foi professor, dentre outros, de Renato  (família Popó) Rafael, Reginaldo, Antoniel, Felipe, Santo Amaril, José Sampaio, Fausto, João Enfermeiro e Mundinho.

A partir dos anos 70, mestre Alexandrão seria seguido pelos mestres Zé Graça, Wilson, Zé Marcos, Tunga, Rony, Jairzinho Damascena, Viola, Isaías, Marinaldo, Queu, Carlinhos, etc., alguns dos quais ainda em plena atividade.

Na década de noventa, com o objetivo de melhor promover e incentivar a prática capoeirística, os mestres Carlinhos e Viola fundaram a Associação das Academias de Capoeira de Senhor do Bonfim. Ainda com o mesmo propósito, foi fundada, posteriormente, a “Revista União e Capoeira”, a única do Estado da Bahia, hoje na 11ª edição.


Serviços sociais

É de se reconhecer os méritos desses incansáveis e abnegados mestres bonfinenses que, tocados pelo amor incontido à causa da Capoeira, não costumam medir esforços no trabalho diário de disseminação desta belíssima modalidade da cultura afro-descendente. Os serviços sociais por eles desempenhados vão desde os grandes festivais culturais, promovidos a cada ano, até ações mais simples e rotineiras, a exemplo de oficinas de pintura, aulas de alongamento e aeróbica, treinamento de Capoeira, etc., que são oferecidos a jovens, crianças e idosos oriundos das camadas menos favorecidas da comunidade.


Leis

Duas leis, recentemente aprovadas pela Câmara de Senhor do Bonfim e sancionadas pelo Chefe do Executivo Municipal, deverão contribuir para um melhor reconhecimento do papel cultural, educativo e social da capoeira em nosso município. São elas:

1-    Lei nº 1.227/2011, de 16 de setembro de 2011, que institui a Semana Municipal da Capoeira, a ser comemorada no período de 1º a 7 de agosto de cada ano. Diversas atividades, tais como festivais, competições, palestras, exposições audiovisuais, etc., integrarão a grade de comemorações.

2-    Lei nº 1.226/2011, também de 16 de setembro de 2011, que introduz o ensino e a prática da Capoeira nas escolas municipais de Senhor do Bonfim. Entre os objetivos apontados pela referida lei, convêm destacar: 1) proporcionar aos alunos da rede pública municipal o acesso a dados e informações que apontem a importância da capoeira como fator de integração comunidade/escola; 2) analisar e qualificar as condições de utilização da Capoeira como fator de integração social e desenvolvimento da consciência dos cidadãos e cidadãs; 3) produzir material didático, com o fim de disseminar conhecimentos relacionados à prática da Capoeira nas escolas municipais.

A Capoeira bonfinense encontra-se em estado de graça. Tomara que as ações acima referidas possam, de fato, concorrer para um maior e efetivo desenvolvimento da prática da Capoeira em nosso município, de forma a contribuir com a construção de uma cultura que tenha como foco a paz, a justiça social e a plena cidadania.

Oxalá!